por João Amendoeira Peixoto
in Jornal Cidade de Tomar - 30 de Junho de 2017.
Domingos Vieira Serrão é
o pintor tomarense que tem uma obra no Museu do Louvre em Paris.Faço uma breve
interrupção da descrição do livro da autoria do Padre António
Carvalho da Costa, que muitas novidades sobre Tomar tem trazido aos
nabantinos, para glorificar um grande tomarense do passado com quem
se deve contar para o futuro.
Vieira Serrão é um
pintor do estilo maneirista (Maneirismo), nascido em Tomar no ano de
1570, onde viveu, sendo filho de João Henriques Serrão elemento da
Ordem de Cristo. Tornou-se em 1619 um dos pintores preferidos do rei
D. Filipe II de Portugal e III de Espanha, tendo sido nomeado como
pintor real. Falece em Tomar em 1632.1
Para quem não conhece o
pintor, decerto que já terá contemplado as suas fascinantes e
enigmáticas figuras femininas presentes na Charola do Convento de
Cristo, alegorias da Fé e da Caridade, sendo-lhe igualmente
atribuída a autoria da Ressurreição de Cristo presente na
nave manuelina.1,2
A catalogação das obras
de Vieira Serrão, considerando que algumas delas estão em parte
incerta, e o consentimento da criação de cópias das originais,
para que se crie um espólio do autor, são obrigatórias a meu ver
para se conseguir reconstruir um grande pintor que merece o brilho e
atenção dos tomarenses e do Mundo. Pois este é dos poucos e
grandes artistas que nasceu em Tomar.
Não é necessário ser
um visionário para entender que o espólio da obra de Domingos
Serrão, pintor natural de Tomar, deve ser reunido, seja em telas, em
pedra ou em projeção, ou em todas elas, num único local para
visita turística obrigatória. Por vezes tudo depende da forma como
se expõe o que há para redimensionar.
Os museus são o ADN e a
imagem de marca das turísticas cidades europeias como é por exemplo
o caso de Barcelona, cidade onde os mesmos são a alma, a sua própria
identidade e grande fonte de receitas. Nesta cidade da Catalunha,
devido à história passada mercantil, até têm um Museu do
Chocolate cujo bilhete é em chocolate com a bandeira da nação
do visitante.
A dimensão pitoresca de
Serrão Vieira é imensa e o estudo da sua obra torna-se uma
verdadeira epopeia.
Há uma pintura bastante
conhecida que o pintor tomarense concebeu em conjunto com Simão
Rodrigues denominada Adoração dos Magos, que percorre as
casas de Portugal e do Mundo através de um prato festivo Festa de
Natal de 1985 da Vista Alegre (Nº15), sobre a temática dos Reis
Magos. Na base do prato é mencionado o Museu Machado de Castro em
Coimbra. No site deste museu coimbrense, podemos encontrar uma outra
pintura de Vieira Serrão de nome Nascimento da Virgem.3
Sobre o pintor nabantino,
o livro A Pintura Maneirista em Portugal da autoria de Vítor
Serrão, tem as seguintes obras conhecidas a apontar: A
Ressurreição de Cristo no Portal da Charola, a duas figuras Fé
e Caridade igualmente presentes no Convento de Cristo em Tomar; a
pintura Calvário no Museu do Louvre (inv.º Nº18487), que de
acordo com o autor foi levada para França pelas tropas napoleónicas.
De acordo com Vítor Serrão, esta pintura presente em Paris tem
bastante afinidade com uma outra que pertence a um conjunto de
trabalhos de nove painéis atualmente na Igreja matriz de Tancos.4
Consagrando este grande
pintor natural de Tomar, de apontar os seguintes quadros romanistas:
A Flagelação de Cristo muito parecida com a que está
presente no portal da Charola presente na Ermida de Nossa Senhora do
Vale de Torres Novas, um segundo quadro de S. Miguel e as Almas do
Purgatório na Quinta da Torre de S. António de Gateiras, a obra
S. Domingos de Gusmão na Igreja da Misericórdia de Tomar e o
quadro Repouso na Fuga para o Egipto da Igreja de Dornes.4
Em 1602 é um dos
fundadores da Irmandade de S. Lucas, que se tratava de uma associação
de pintores, o que transborda a sua dinâmica entre os artistas da
sua época e lhe confere notoriedade.5
A partir desta data o
pintor Domingos Vieira Serrão surge ligado a vários trabalhos
conjuntos com Simão Rodrigues (1560-1629), tais como os retábulos
sobre a Vida de Cristo e uma imagem da Padroeira na
Igreja do Carmo em Coimbra e na Capela da Universidade de Coimbra.6
Numa apreciação de
Vítor Serrão, as obras Adoração dos Pastores e a Adoração
dos Magos são da autoria única do pintor de Tomar, dada a
modelação mais forte e naturalista que se destaca da forma de
intervenção de Simão Rodrigues.4
Para além de trabalhos
na Igreja do Carmo e na Capela da Universidade de Coimbra são
assinalados igualmente obras na Sacristia da Sé Velha, conventos de
Sant'Ana e Santa Clara, assim como, na Igreja do Mosteiro de Santa
Cruz.7
O Imperador Heráclio
e o exaltamento da Santa Cruz é um painel do antigo retábulo do
mosteiro de Santa Cruz de Coimbra, de cerca de 1605 e que está na
Sacristia da Igreja do Carmo de Coimbra, demonstra a qualidade dos
trabalhos dos pintores Domingos Serrão e Simão Rodrigues.7
Outras obras podem ser
apreciadas no Museu de São Roque, Nossa Senhora da Misericórdia,
onde numa das pinturas surge a Virgem elevada num manto segurado por
dois anjos, enquanto diversos elementos a observam.8
Realizou um grande fresco
na Igreja do Mosteiro da Anunciada em 1608, assim como, no teto da
Igreja do Hospital de Todos os Santos em 1613, ambos destruídos em
1755, tendo em 1619 desenhado a conhecida Panorâmica da Cidade de
Lisboa, quando a visita do rei D. Filipe II de Portugal.5
Após, participou
novamente com Simão Rodrigues na criação de vinte e três telas em
Santa Cruz de Coimbra, coleção que estará desaparecida. Tendo
depois realizado notáveis obras em Madrid, onde parte delas terão
desaparecido para sempre devido a um incêndio em 1750.4
Há uma pintura sobre
Maria Madalena a assinalar, que a ser da autoria de Domingos
Vieira Serrão, mostra o talento e importância da elevação deste
pintor tomarense, que destaca a adoração a Cristo, onde na tela
surge igualmente um livro e uma caveira no seu simbolismo mais
profundo. A meu ver, este é um quadro de uma dimensão enorme (de
génio) que consagra a qualidade e importância deste senhor das
artes.9
Devo igualmente destacar
a amplitude dos trabalhos pitorescos na Sacristia e Capela do
Santíssimo Sacramento em Elvas, iniciadas em 1615 na companhia de
Simão Rodrigues, e continuadas em 1631, já sozinho pela morte do
seu colega em 1629, pouco antes da sua em 1632.10
Esta é a real dimensão
de um homem de Tomar, que vive tão pouco para a sua enorme obra e ao
mesmo tempo tão perto de todos pelos trabalhos que tem entre nós,
mas que de certa forma está desleixadamente adormecido no que toca à
sua fama. Que a merece, tornando a cidade de Tomar muito mais rica se
se criar um museu para o público contemplar o seu espólio.
Domingos Vieira Serrão é
um tomarense do tamanho do mundo.
Bibliografia
- Barreira, João. Arte portuguesa. Edições Excelsior. 2008
- Freira, José Geraldes. Notas de Investigação. HVMANITAS. Vol. XLVIII (1996).
- Serrão, Vítor. A Pintura Maneirista em Portugal. Instituto de Cultura e Língua Portuguesa. 1991.
- Garcia, Ana. Domingos Vieira Serrão. Pintor da Contra-Maniera em Portugal: Entre Decoro e Conformismo. Universidade de Coimbra, 1996.
- Serrão, Vítor. Simão Rodrigues em Roma. PROMONITORIA. Ano 1 Nº1. 2002/2003.
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